quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

dualismo verdade-mentira

“Grande parte das notícias são mentira” -
afirmou Pedro Cruz, da SIC, na Faculdade de Filosofia da Católica


O jornalista da SIC, Pedro Cruz, deteve-se na consideração das “meias-verdades” e das “mentiras piedosas” que proliferam no jornalismo, construídas na base do incontornável “eu tenho ouvisto dizer”.
Numa exposição marcada pela preocupação em situar o dualismo Verdade-Mentira na área da comunicação social este docente do Curso de Ciências da Comunicação da Faculdade de Filosofia apresentou com grande agilidade mental e discursiva as múltiplas faces deste problema.

No âmbito do Seminário “Estes dualismos que nos perseguem”, coube ontem (dia 28 de Novembro de 2007) a Pedro Cruz apresentar o par “Verdade-Mentira”, sublinhando as dificuldades em encontrar a verdade absoluta no seio de uma actividade tão susceptível ao predomínio das “opiniões” como é a do jornalismo.
Grande parte das notícias que passamos são mentira”, atira provocatoriamente Pedro Cruz. Porém, isto não torna os jornalistas mentirosos, uma vez que, “o jornalista está dependente de relatos e testemunhos, esses sim, muitas vezes, pouco verdadeiros”, explicou. “O jornalista tem de dar voz às pessoas”. E muitas vezes, estas preocupam-se sobretudo em protegerem-se, elaborando as versões que melhor salvaguardem os seus interesses. O jornalista tem de cultivar a prudência, pois movimenta-se frequentemente entre versões contraditórias de factos que não foram directamente presenciados senão pelos próprios envolvidos. Qual deles possui um olhar “mais” objectivo, “mais” verdadeiro? O jornalista sabe que não pode/deve “tomar partido”, e do ponto de vista deontológico tem de proteger as fontes, não pode divulgar as conversas em off the record. Mas também sabe que dá a cara, empresta a voz, intervém, observa, avalia, pondera… Que bom seria possuir “o olho de Deus”, quer dizer, o ponto de vista absoluto, a verdade única e total! Mas – suscitando em nós a reminiscência da sofística - este profissional remata: “a verdade é que não há uma verdade única e absoluta, não existe esse ‘olho de Deus’». Para o jornalista da SIC a verdade posta em obra nas notícias resulta sempre de conhecimentos, interpretações que as testemunhas fazem dos factos.
Então, lavam-se as mãos da verdade e da mentira como se tudo valesse o mesmo? Pedro Cruz tem consciência da imagem, hoje muito em voga, do jornalista “pingue-pongue”, oportunista, sem escrúpulos, capaz de instrumentalizar as situações para construir, também ele, “a versão” mais conveniente. Mas contesta - não é verdade que se possam medir por essa bitola todos os profissionais da comunicação. O “atestado de estupidez e idiotice que se passa aos jornalistas” aplica-se a alguns, mas não é a regra. Explica que é tão perniciosa essa imagem como a do estereótipo do jornalista arrogante, vaidoso e preguiçoso que absorve toda informação sem qualquer juízo crítico. Ora, não é, definitivamente, nesse paradigma que ele se move. Pelo contrário, a sua reserva crítica fazem-no recuar, ou não avançar com processos de cuja autenticidade duvida: “muitos casos estão parados nas redacções porque nos ‘cheiram a esturro’, não nos dão margem de confiança”, confidenciou. Uma questão de consciência e de formação; no fundo, isso é o essencial.
O diálogo com este jornalista, após a sua exposição, foi muito vivo e polémico, com o auditório esgrimindo pontos de vista que circulavam entre as esferas da comunicação, da filosofia, da psicologia, da análise cultural e sociológica.
A sala encheu-se de alunos e professores que saíram mais convictos e conscientes de como somos “perseguidos” por esta bipolar relação da verdade e mentira.
É com manifesta satisfação que se verifica que este Seminário, da iniciativa do Prof. Alfredo Dinis e inserido no plano de actividades do Centro de Estudos Filosóficos e Humanísticos da Faculdade de Filosofia, está a movimentar e a interessar a comunidade académica desta Faculdade. Pressentimos e auguramos que o debate ainda vai aquecer mais!

(Marisa Almeida, Sara Pinheiro (alunas) e Carlos Morais (docente)
(Gabinete de Comunicação e Imagem da Faculdade de Filosofia)

2 comentários:

Dominique Machado disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Dominique Machado disse...

“a verdade é que não há uma verdade única e absoluta, não existe esse ‘olho de Deus’. Ainda bem que assim o é. Todos precisamos de umas boas verdades e de umas boas mentiras para "separar o trigo do jóio". Em relação ao jornalismo, é de facto complicado fazer esta separação quando a vítima mais fácil é de facto o jornalismo recém chegado ao "local do crime". Creio, no entanto, que uma boa dose de espirito crítico e um bom "faro jornalístico" será assaz. Generalizar o jornalista como um mentiroso é logicamente um absurdo. Concordo com Pedro Cruz em toda a sua essência.