domingo, 27 de janeiro de 2008

natural-sobrenatural

Na próxima quarta-feira, 30 de Janeiro, realiza-se às 18h mais um encontro de debate sobre 'estes dualismos que nos perseguem'. Desta vez, João Duque, docente da Faculdade de Teologia, abordará o dualismo 'natural-sobrenatural'.



O termos em análise devem tomar-se, antes de tudo, como adjectivos. Mas que adjectivam eles, afinal? Poderíamos falar em vida natural e em vida sobrenatural. Ou, talvez melhor e de modo mais abrangente, em mundo natural e mundo sobrenatural.

Mas o que são esses mundos? O que é um mundo, afinal? Partindo do pressuposto que um mundo é uma interpretação do real (entendendo aqui «real» como tudo aquilo que, simplesmente, é), então, os adjectivos são qualificações de interpretações do real. Ou então, são duas dimensões de uma determinada interpretação do real – por isso, também, duas dimensões do real (não propriamente duas realidades).

Que significa, então, interpretar o real como natural? Talvez como algo necessário (natural lógico); ou como algo dentro das capacidades da natureza (natural ontológico); ou aquilo que podemos explicar (natural epistemológico).
E o que significa a adjectivação de sobrenatural? A consideração do gratuito, do livre, para além da necessidade; ou a consideração do que vai além das possibilidades de determinada natureza; ou então, o inexplicável e inacessível ao conhecimento (mesmo, num desvio estranho mas frequente, o «oculto»).

Mas que necessidade natural ou que natureza origina a natureza? Será o mundo naturalmente natural? E onde se dá – fenomenicamente – o mundo sobrenatural? Dentro ou fora do natural? Não será o mundo naturalmente sobrenatural e sobrenaturalmente natural?

Mas não será possível, mesmo legítimo, interpretar o mundo apenas naturalmente? E mesmo que consigamos uma perfeita simbiose das duas dimensões, porquê a sua utilização, então? Mesmo que abandonemos uma posição dualista ou separatista, que pudesse identificar esses dois mundos como realidades independentemente subsistentes, fará ainda sentido utilizar a distinção entre dimensão natural e dimensão sobrenatural do mundo? Fará sentido, mesmo lógico, falar em natureza sobrenatural ou em sobrenatureza natural? Devemos, então, abandonar esses adjectivos clássicos da teologia e da filosofia, ou farão ainda algum sentido? Ou não resultam esses problemas da ausência de um pensamento analógico, que funciona mais em termos de univocidade e de equivocidade?

Para repensar a questão, talvez ajude introduzir as noções de secularização e de imanentismo. Qual o significado da distinção natural-sobrenatural, perante as realidades albergadas nessas noções?
João Duque

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

natureza-graça

Na próxima quarta-feira, 23 de Janeiro, às 18h, terá lugar na Faculdade de Filosofia, sala 3.1, o debate orientado por Manuel Sumares em torno do dualismo 'natureza-graça'.

O seguinte texto lança desde já o debate.



“We imagine that the gratuitous needs to be contrasted with the obligatory or the inherent; yet this only applies to the interactions between beings in the ontic realm. In the realm of the ontological difference, of the creative emergence of entia from esse, gratuity arises before necessity or obligation and does not require this contrast in order to be comprehensible. The creature is not the recipient of a gift; it is this gift.”

--- John Milbank, The Suspended Middle: Henri de Lubac and the Debate Concerning the Supernatural, p. 43.

O ponto de partida para a nossa reflexão:

“p” is true iff p in w/t
“p”= “creation is always/ already graced”
p = creation is always/ already graced (or “gifted”)
w= world
t= time
Hence, “Creation is always/ already graced” is true if and only if creation is effectively always/ already graced in a determinate world and within a determinate timeframe.

domingo, 13 de janeiro de 2008

Inconsciente – consciente

No próximo dia 16 de Janeiro, às 18h – sala 3.1
José António Alves abordará o dualismo 'consciente-inconsciente'
Este texto lança desde já o debate

A Consciência apresenta-se, depois de Descartes, como a propriedade essencial da mente humana. Trata-se de uma propriedade que todas as propriedades devem ter para ser consideradas de propriedades mentais. Por exemplo, o pensamento só é propriedade mental enquanto pensamento consciente. Tanto Descartes como outros pensadores não se preocupam em fazer uma análise da consciência, pois esta apresenta-se-lhes como sendo uma propriedade cuja natureza se manifesta na experiência. Outro aspecto que Descartes focaliza é o factor unificador da consciência, reunindo os estados mentais num único local denominado de Ego. Assim, para Descartes, a consciência é a base da certeza. A consciência é a luz que ilumina tudo que cai sobre a sua alçada.

A esta posição de Descartes opôs-se Leibniz falando de percepções e pensamentos inconscientes. Leibniz desfaz a igualdade de Descartes segundo a qual a mente era igual à consciência. Deste modo, contra as ideias vigentes na época, abriu espaço à ideia de que processos inconscientes afectavam a formação de pensamentos, julgamentos e tomadas de decisões. Ora este modo de pensar não podia estar mais contra o século da razão e a ideia de que o ser humano tudo controla.
Focalizo estes dois autores, Descartes e Leibniz, porque são os dois pensadores que se pode considerar estarem na origem dos dois conceitos que se contrapõem nesta apresentação: consciente e inconsciente.
E o que é que está em contraposição? Apenas dois conceitos? Duas visões de mundo? Dois substantivos ou dois adjectivos? Serão duas realidades claramente separadas? Que papel desempenham na vida humana? Esboçam, os dois conceitos, um dualismo que nos persegue positiva ou negativamente ou não há dualismo nenhum?

Para a apresentação não se perder no meio das múltiplas possibilidades de abordar esta temática, baixa-se o enfoque sobre a acção humana.
Estudos empíricos sobre a consciência humana têm mostrado dados curiosos. Um desses estudos é o do neurocientista americano Benjamin Libet.
A consciência, como muito bem viu Descartes, evidencia-se como uma das coisas de que mais o ser humano é certo. Mais, a certeza da consciência é de que tudo se experimenta imediatamente no seu espaço diáfano. Quer a experiência diga respeito à percepção, quer a experiência diga respeito à vontade de querer agir, acontece sempre aqui e agora.

Na década de 1950, Benjamin Libet desenvolveu uma investigação sobre a consciência humana da qual concluiu que a consciência humana está meio segundo atrasada em relação à ocorrência dos estímulos do sistema nervoso. Concluiu que a experiência consciente não é imediata. Mas mais que isso. Em estudos subsequentes, sobre a liberdade humana, veio a concluir que antes do ser humano tomar consciência da vontade de querer agir já o cérebro desencadeara os processos cerebrais associados a determinada acção.

Será a consciência uma mera ilusão? As acções e decisões, que parecem conscientes, no fundo serão meros processos inconscientes? Quem realmente controla o ser humano, a consciência ou o inconsciente?

O inconsciente foi um conceito que demorou a conquistar o seu espaço na cena intelectual. Contudo, desde que Leibniz o trouxe à luz do pensamento, tem sido um conceito em franco desenvolvimento. Inclusive, não se exagerará muito ao dizer que tem tomado o lugar que a consciência teve. São muitos os estudos no âmbito das ciências cognitivas que apresentam a tese da ilusão da consciência para afirmarem a força dos mecanismos inconscientes da mente humana. E até se afirma, concretamente o psicólogo Julian Jaynes, que a consciência é um fenómeno recente na história do homo sapiens. Data apenas de, mais ou menos, há 2500 anos. Encontrar-se-á na Ilíada os seus primeiros vestígios. Parece que quanto mais se estuda o assunto mais se sublinha esta tendência de valorizar o inconsciente em detrimento do consciente.
Tem havido modos diferentes de conceber o inconsciente. Desde o romantismo que sublinhava a agência independente dentro da mente capaz de criar obras de arte de se organizar numa identidade, a uma versão mais mecanicista, segundo a qual a mente humana é regida por mecanismos inconscientes que funcionam através de processos impessoais e desinteressados, até à versão do incontornável Freud para quem o inconsciente é a verdadeira realidade psíquica.
Porém perguntar-se-á: se o interessante é o inconsciente e a consciência é uma ilusão, porque a é de um modo tão constante e tão espalhado pela humanidade? Se é possível explicar o comportamento sem a consciência, porque estará ela sempre presente? Qual será o seu papel? Se os processos inconscientes parecem ter tanto espaço e tanta eficiência, porque se deu a natureza ao trabalho de colocar na espécie humana a consciência?
A defesa do automatismo sugere que a perfeição nada tem a ver com sermos conscientes. Sabemos que há órgãos que perderam a função orgânica do passado. No entanto, porque razão a consciência, na mesma linha da defesa do automatismo, nunca teve, não tem e nem mostra probabilidades de vir a ter alguma função?

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Faculdade de Filosofia
Projecto de Investigação Epistemic studies (2007-2010)
Seminário: “Estes dualismos que nos perseguem”
2007-2008

Calendarização

Novembro 7: Alfredo Dinis: corpo-alma
Novembro 21: Pedro Cruz: verdade-mentira
Dezembro 12: Artur Galvão: racional-irracional
Janeiro 16: José António: consciente-inconsciente
Janeiro 23: Manuel Sumares: natureza-graça
Janeiro 30: João Duque: natural-sobrenatural
Fevereiro 6: Joana Sá Ferreira: este mundo e o outro
Fevereiro 27: João Carlos Major: mente-cérebro
Março 5: Susana Moreira: ensinar/aprender
Março 12: Manuel Curado: a bruxa e o Inquisidor
Abril 2: Francisco Teixeira: Deus e o diabo
Abril 9: M. Fátima Lobo: homem-mulher
Abril 16: José Henrique: bem-mal
Abril 23: Roque Cabral: indivíduo-sociedade
Abril 30: J. M. Dias Costa: sagrado-profano
Maio 7: J. R. Costa Pinto: imanência-transcendência
Maio 14: Álvaro Balsas: tempo-eternidade
Maio 21: Ângela Azevedo: cognição-emoção
Maio 28: Carlos Morais: belo-bruto
Junho 4: António Fonseca: jovem-idoso